quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Comida. nos coxos,igual animal


Pois agora gentes, vossas senhorias podem ir se preparando pro pior. Afora as circunstancias desagradaveis da viagem longa, agora vai ser diferente: Agora é diferente : a comida é coletiva, um horror. nos coxos,igual animal, conquanto de inox,higiênica, cheia de remedios. O formol pro corpo vem aos poucos, em rações diarias de doses de pequenas mortes consecutivas. A comida, constantemente reaquecida, oxidada, caldo de bacterias mortas, semivivas, remontada de acrescimos, remexida, pasteurizada, pelos contínuos quentes-frios. Nos coxos, é servida aos jorros, sem o nenhum respeito, desmontada, remontada, liquidificada. Arrasada, os sabores indefinidos, multiplos, inaturais, sem predominancia, muito socializada, igual pra todos, uma lavagem pra porcos de confinamento. A morte lenta, veneno programado, o conservante da morte. Nos panelões, coletiva, remexida, reaproveitada, econômica; líquida, que nem dos porcos, sensaborona, retornada daquele mesmo reservatorio comum, sempre bulida fuçada pelas mesmas conchas e espumadeira, revolvida para aflorar as melhores partes, escolhidas, restando apenas um caldo indefinido, sem origem clara, composto, não individual: "Num pesca não meu irmão, vai pela sorte, senão me deixa só o caldo". Que coisa horrível meu Deus! Comemos feito animais domésticos, os restos, ruidosamente, aos nacos, engolidos mecanicamente e automaticos sem o nenhum respeito pela hora sagrada, sem oração de precedimento, sem rezas, como uzdo antigamente nas casas de familia, a hora de comer um acontecimento impolgante cheio de significado. Um ato solene, cheio de circunstancias do momento de encontro e respeito: um ato de vida. Comia-se? ... não! muito mais que isso, um momento sublime de repasto do espírito, de contrição e respeito pela vida. Fazia-se a refeição com respeito ao ato solene de comer e gostar do que estava se fazendo, com rezas e agradecimentos. Lembro meu velho pai, imperial e majestoso na cabeceira da mesa: levava horas, naquele prazer dispendioso, macetando, espremendo e compondo aquilo do gosto, aos pequenos goles e sorvos, uma demora planejada.